terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Relatório da 3ª Reunião Extraordinária da Câmara Técnica de Controle Ambiental do CONAMA



A fim de publicizar as decisões, democratizar as discussões e prestar contas de minha participação como Conselheiro representando a sociedade civil amazônida no CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente, através dos Argonautas Ambientalistas da Amazônia, disponibilizo o Relatório que elaborei da sua 3ª Reunião Extraordinária da Câmara Técnica de Controle Ambiental.

A reunião ocorreu dia 11 de dezembro de 2015, no Ministério do Meio Ambiente, em Brasília, onde foi apresentada por Eugênio Spengler, Secretário de Estado do Meio Ambiente da Bahia uma minuta com proposta que dispõe sobre “critérios e diretrizes gerais do licenciamento ambiental, disciplina suas modalidades, estudos ambientais, bem como seus procedimentos, e dá outras providências”.  A proposta é de autoria da ABEMA – Associação Brasileira de Entidades Estaduais do Meio Ambiente, que agrega os secretários estaduais do meio ambiente de todo o Brasil, que constituiu um Grupo de Trabalho composto por integrantes de seis Estados (São Paulo, Mato Grosso do Sul, Espírito Santo, Maranhão, Bahia e Mato Grosso) e, segundo o secretário baiano, discutiu o tema em seminários regionais e nacional, chegando a essa formulação apresentada, que propõe a revisão das Resoluções  001/86 e 237/97 do CONAMA que atualmente disciplinam os procedimentos para o Licenciamento Ambiental.

Há uma preocupação de setores do CONAMA com as iniciativas que o Congresso Nacional tem tomado para regulamentar aspectos variados dos temas ambientais, esvaziando as atribuições do Conselho. E o licenciamento tem sido objeto de discussões e propostas em trâmite no Senado, por exemplo, assim como na Câmara dos Deputados outras iniciativas tramitam neste tema e em outros relacionados a qualidade ambiental. E pela atual conformação do Congresso Nacional, geralmente as alterações têm sido bastante prejudiciais ao controle e qualidade ambiental. Daí a iniciativa da ABEMA e uma certa urgência para tramitação da proposta, antes que o assunto seja esgotado no Congresso Nacional, assumindo o protagonismo na deliberação.

Desde que foi aprovada a Lei Complementar 140, de 08 de dezembro de 2011, que fixa normas para a cooperação entre os entes federados nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativa a proteção ambiental, houve um fortalecimento e iniciativa dos Municípios, como entes federados, a regulamentarem sua gestão e licenciamento ambiental, assim como diversos Estados aprovaram normas sobre o tema, gerando uma diversidade de modalidades de licenciamento que muitas vezes são divergentes entre si, quando comparados diferentes entes licenciadores em relação ao mesmo tipo de atividade. Ou seja, há a necessidade de unificação, pelo menos através de normas e padrões gerais, sobre o licenciamento ambiental, a partir de uma visão sistêmica do SISNAMA. O consenso é que o atual modelo em geral é falho. Como ele será regulamentado é que precisa de discussão e reflexão, de modo que não haja um enfraquecimento ou rebaixamento dos padrões para atender a necessidades do mercado ou de setores governamentais, mas mesmo que simplificando alguns procedimentos, que se garanta o papel regulador do Estado e a proteção e o controle ambiental com base em padrões de qualidade confiáveis.

A minuta apresentada não foi debatida pela Câmara Técnica, que preferiu consensualmente aprovar a criação de um Grupo de Trabalho, composto por 25 membros do CONAMA, dos quais cinco de cada segmento representado no Conselho, para num prazo de 60 dias (a partir de 14 de janeiro) avaliar e discutir a proposta e apresentar os eventuais dissensos, consensos e contribuições para a Câmara então fazer sua deliberação, já que o Grupo não tem caráter deliberativo, mas de subsídio técnico. Cada segmento tem até o dia 21 de dezembro para comunicar quem serão seus representantes no GT. Por sugestão consensual entre Argonautas (Fidelis Paixão) e Sócios da Natureza (Tadeu Santos), representantes da Sociedade Civil na Câmara, propomos que as cinco vagas sejam ocupadas pelo Instituto Guaicuy (que assumirá a vaga do Sócios da Natureza em 2016 na Câmara), por Argonautas (que continuará na sua composição), pelos Sócios da Natureza (que são atual integrantes) que somariam três representantes das Ongs cadastradas no CNEA e por outros dois representantes dos demais segmentos da sociedade civil:  FBCN e outra vaga para ABES ou Planeta Verde.

O Grupo de Trabalho iniciará suas atividades dias 14 e 15 de janeiro de 2016, em Brasília, e deverá realizar um Seminário em cada região, visando subsidiar seus trabalhos. As reuniões e seminários são abertos ao público, com direito a voz, mas somente os seus membros formais têm direito a voto, lembrando que o GT não tem caráter deliberativo. O GT será coordenado pela representação do Governo Federal, tendo como relator o representante do Governo da Bahia e como vice coordenadora a representante da CNT.

Segundo a justificativa da minuta proposta pela ABEMA, os aspectos centrais de sua resolução são os seguintes:

1. Procedimento de licenciamento unificado, onde se avalia, em uma única fase, os aspectos relacionados à localização, implantação e operação do empreendimento ou atividade;
2. Procedimento de licenciamento ambiental eletrônico, para determinadas tipologias de empreendimentos ou atividades, de baixo e médio potencial poluidor, em uma única fase, por meio de declaração de adesão e compromisso do empreendedor aos critérios e pré-condições estabelecidas pelo órgão ambiental licenciador;
3. Procedimento de registro eletrônico, de caráter declaratório, para determinados empreendimentos ou atividades, de baixo potencial poluidor, no qual o empreendedor insere os dados e informações relativos ao empreendimento ou atividade, a serem especificados pelo órgão licenciador;
4. Procedimento de licenciamento ambiental de regularização para empreendimentos ou atividades que se encontrem implantados ou em operação sem prévia licença ambiental;
5. Previsão da definição, em ato normativo, pelos entes federativos, no âmbito de suas competências, do prévio enquadramento da atividade ou empreendimento, considerando os critérios de localização, porte, potencial poluidor e natureza, com vistas à otimização e parametrização de requisitos e, consequente, minimização do excesso de subjetividade dos agentes públicos responsáveis na classificação para fins de licenciamento ambiental;
6. Regulamentação das diversas modalidades de estudos de avaliação de impacto ambiental a serem exigidos no processo de licenciamento ambiental em função da magnitude dos impactos esperados, considerando os critérios de porte, potencial poluidor, natureza e localização do empreendimento ou atividade;
7. Previsão da criação, no âmbito dos entes federativos, de Base de Dados e Informações Ambientais, com vistas à racionalização dos estudos exigidos para fins de avaliação de impacto ambiental, inclusive do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental – EIA/RIMA, bem como ampliar a publicidade e o controle social nos procedimentos de licenciamento ambiental.

No documento de justificativa da proposta da ABEMA existem afirmações polêmicas, algumas delas, na minha opinião, baseadas em um senso comum generalizado, que carecem de dados mais embasados em pesquisa para serem levadas a termo, como exemplo: “o escopo do licenciável é incompatível com a realidade do Estado e a necessidade da sociedade”, que “ a porcentagem de empreendimentos licenciados que são fiscalizados é infinitamente inferior à necessidade, tendo em vista o comprometimento da equipe técnica para análises processuais”, ou que o “ambiente de insegurança jurídica tem contribuído para que o licenciamento ambiental sofra com diversos problemas, assim resumidos: a) falta de clareza sobre os aspectos a serem avaliados; b) excesso de discricionariedade dos agentes públicos responsáveis; c) crescente interferência de órgãos intervenientes no processo; d) ritos processuais inadequados às características dos diferentes empreendimentos; e) estabelecimento de condicionantes que extrapolam a análise de impacto ambiental; (...)”

A ABEMA alega ter preparado estudo sobre o tema, então tomo a liberdade de disponibilizar aqui o estudo alegado, denominado “Novas Propostas para o Licenciamento Ambiental no Brasil” que precisa ser do conhecimento e análise de todos, uma vez que titulares de secretarias estaduais do meio ambiente não representam, necessariamente, o interesse ou a visão do conjunto da sociedade brasileira, especialmente das organizações e dos ativistas não governamentais. Por fim, clicando neste link se poderá ter acesso ao Processo que tramita na Câmara Técnica com a proposta em discussão.

Belém – PA, 14 de dezembro de 2015

Fidelis Jr. Martins da Paixão
Conselheiro CONAMA
Argonautas Ambientalistas da Amazônia

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Nota sobre a tragédia de Mariana (MG)



As entidades ambientalistas do CONAMA vem a público manifestar sua solidariedade às vítimas do grave evento envolvendo o rompimento das barragens interligadas de Fundão e Santarém da empresa Samarco Mineração (Vale/BHP) no município de Mariana,  ocorrido no dia 05 de novembro de 2015. Esta tragédia pode ser considerada o pior “acidente” da história ambiental do estado de Minas Gerais e do Brasil.  Trata-se de um inconcebível e evitável evento de origem ambiental e ocupacional com desastrosas repercussões sociais e ambientais.

O rompimento provocou a liberação de 62 milhões de metros cúbicos de rejeitos que formaram um onda que atingiu uma altura de aproximadamente 10 mts de altura, provocando por onde passou um rastro de destruição e morte. Os números ainda são imprecisos até o presente momento, mas além de 9 mortos há pelo menos duas dezenas de desaparecidos e milhares de pessoas atingidas direta e indiretamente.  Trabalhadores da empresa e de empresas terceirizadas estão entre as vítimas desta tragédia. Houve destruição de  comunidades rurais, invasão e destruição de terras férteis de agricultores familiares além da contaminação de cursos de d’água da região atingindo toda a extensão do  Rio Doce, provocando danos a cerca de 550 Kms de distância do epicentro do rompimento.

Pode-se afirmar que grande parte dos danos ambientais e sociais serão irreparáveis e permanentes como as perdas de vidas humanas e dos ecossistemas. 

Esta não é situação isolada mas um capitulo que mais uma vez se repete na  história da mineração ao longo pelo menos dos últimos 14 anos.  Foi assim com a Mineração Rio Verde em  Nova Lima em 2001, com a Mineração Rio Pomba Cataguases em Miraí em 2007, e com a Mineração Herculano em Itabirito em 2014.  

Não podemos considerar este fato  como uma fatalidade mas como tragédia anunciada. A empresa ao construir grandes barragens, com alteamentos dentro dos limites máximos permitido assumiu o  grau de risco cada vez maior.  

E na hora do desastre não havia nenhum plano de contingência a ser acionado, sequer um alarme. E a perda de vidas só não foi maior devido à ação heróica e solidária de trabalhadores e pessoas residentes no local.

Para que se estabeleça a verdade histórica é  preciso reafirmar que vítimas foram todos os que morreram, perderam os seus patrimônios, sofreram as consequências dos danos ocupacionais e ambientais.


Este desastre demonstrou a insustentabilidade da gestão ocupacional e ambiental demonstrando as falhas no processo de gestão, licenciamento, fiscalização, monitoramento, vigilância e do sistema de emergência. Todos estes processos foram incapazes de garantir a segurança do empreendimento, prevenir e evitar que não houvesse um evento desta magnitude.

É impossível estabelecer ou buscar uma causa única para esta tragédia.Um acidente desta proporção somente foi possível pela  somatória de uma cadeia de eventos e fatores , que precisam ser esclarecidos e colocados a público.

Além de respostas e reparação a todos os que sofreram diretamente e indiretamente as perdas de vidas humanas e ambientais é fundamental que a partir das investigações, haja uma  revisão e criação de novas políticas e  diretrizes sobre as atividades minerarias.

Num momento em que assistimos para todos os lados movimentos de entidades empresarias visando a desburocratização dos licenciamentos ambientais, é importante alertar que isso não pode ser motivo para atropelar as avaliações adequadas do processo de licenciamento, e que este não se trata de um mero instrumento cartorial.

Um evento como o que ocorreu em Mariana alerta para as consequências ocupacionais, ambientais e humanas que podem ser geradas por uma gestão ocupacional e ambiental descomprometidas com a vida, com o meio ambiente, com a saúde dos trabalhadores e da população. 

As entidades ambientalistas com assento no CONAMA solicitam um posicionamento do MMA assim como a criação de uma comissão do CONAMA para fazer um acompanhamento e verificar questões que possam ser colocadas no âmbito deste órgão.

Por fim é possível afirmar que o acidente de Mariana será sempre uma lembrança viva na história de Minas Gerais, uma cicatriz eterna e um alerta constante de que  temos que ter  uma gestão ambiental verdadeiramente comprometida com a vida e o ambiente.

Brasília, 10 de novembro de 2015

Entidades que assinam: 
Instituto Guaicuy, Ponto Terra, Sodemap, Mira Serra, Sócios da Natureza, Argonautas, Kanindé, Furpa, Ecotrópica.